segunda-feira, agosto 21, 2017

O SERVIÇO PÚBLICO DE TRANSPORTES DE PASSAGEIROS (XV Parte - continuação)

O SERVIÇO PÚBLICO DE TRANSPORTES DE PASSAGEIROS 
  (XV  Parte - continuação)

  Os cidadãos começam a perceber que informação é poder

“Quando o Governo não cumpre nem  faz cumprir a lei, algo não está bem

UM MEMORANDO PROSPECTIVO SOBRE O SERVIÇO PÚBLICO DE TRANSPORTE DE PASSAGEIROS. (continuação)

AS GREVES NAS EMPRESAS PÚBLICAS DE TRANSPORTE ([1])
         ( Serviço Público de transporte de passageiros)
O direito de greve é um direito fundamental, consagrado no numero 1 do artigo 57º da Constituição da República Portuguesa, prevendo o n° 3 do mesmo dispositivo que "A lei define as condições da prestação, durante a greve, de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, bem como de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidade sociais impreteríveis."
Deste modo, se é certo que o direito à greve dos trabalhadores é, não apenas reconhecido, mas, mais que isso, garantido pela Constituição, não o é menos que, como bem ensina a nossa melhor Doutrina "Esta limitação constitucional do direito à greve revela que os direitos dos trabalhadores carecem, como os outros direitos, de tarefas metódicas de concordância prática e de juízos de ponderação e de razoabilidade, não prevalecendo em abstracto contra certos bens constitucionais colectivos, designadamente os que têm a ver com serviços de primacial importância social, como os serviços de saúde, de transportes públicos, de segurança, de protecção civil, serviços prisionais, de recolha de resíduos urbanos, de água e de outros 'serviços de interesse económico geral' de natureza afim, em que a continuidade é um valor em si mesmo (princípio da continuidade dos serviços públicos), além de ser uma dimensão organizatória e processual da garantia e realização de direitos, desde direitos, liberdades e garantias como o direito à vida, à integridade física, à liberdade e à segurança, até o direito à saúde e a bens essenciais." ([2])
 Porém, tratando-se de um direito fundamental, o direito de greve só pode ser restringido ou limitado nos justos termos previstos no artigo 18º da Constituição, isto é na medida do necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos e tendo em conta o respeito pelos princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade.
Portanto, que apesar de ser um direito fundamental, o direito de greve não é um direito absoluto, pode ser regulamentado por lei e esta regulamentação pode constituir objectivamente uma restrição ao seu exercício, mas apenas quando se destine a promover a segurança e manutenção de equipamentos e instalações e a ocorrer â satisfação de necessidades sociais impreteríveis e se limite ao necessário para salvaguardar outros direitos e interesses constitucionalmente protegidos.
O Código do Trabalho procede à regulamentação do direito de greve, nos seus artigos 530º a 543º, assumindo particular importância para a questão que agora nos ocupa os artigos 537º – Obrigação de prestação de serviços durante a greve, e 538º – Definição de serviços a assegurar durante a greve.

A NOSSA POSIÇÃO SOBRE AS “GREVES” ([3])

 A propósito da greve geral prevista para o dia 24 de Novembro de 2011, escrevi o seguinte, mas em relação ao mesmo tipo de greve e na mesma data, mas em 2010 . “A propósito da “greve de 24 de Novembro” fiquei a aguardar qual iria ser a posição do Governo perante o incumprimento da Lei e o apuramento de responsabilidades dos “gestores públicos”, que foram incapazes de prever tais situações de incumprimento, por um lado e por outro a permissão de “encerramento da própria empresa prestadora de um serviço público”, contribuindo deste modo para a degradação da imagem da própria acção governativa. ([4] ) Nem o Governo tomou qualquer posição, nem os administradores tomaram qualquer tipo de medida, mas também “nada lhe aconteceu”?
Temos aí exemplarmente toda a onda de “greves”, não respeitando a Lei, nem os cidadãos. Esta situação reflecte desconhecimento, por parte destes “gestores” de que “a empresa em si mesma não tem vontade própria”, sendo que vontade da empresa é constituída pela vontade ou vontades dos seus gestores. Logo, “tudo o que se passa na empresa é da sua responsabilidade”, cabendo-lhe organizá-la “e criar condições de vigilância e controlo para que no desenvolvimento da actividade empresarial não sejam cometidos erros graves de gestão que geram danos irreparáveis na sua actividade, na imagem pública, geradora de prejuízos na actividade e “indisciplina juslaboral, como prestadora de serviços públicos que responsabilidades foram apuradas? Ou por outro lado,   como foi possível que uma greve de transportes públicos possa deixar os passageiros sem transportes alternativos?  
Como foi possível que os responsáveis da gestão destas empresas de transporte não tenham tido a capacidade e a responsabilidade de “preparar adequadamente” a resposta a esta situação([5]) ? Como foi possível, o que acontece pela primeira vez, “ver encerradas as portas” do Metro/Lisboa, da Transtejo/Soflusa ou do Porto de Sines?( [6]).
Como sabemos o direito de greve, enquanto direito fundamental, sofre os limites resultantes da necessária conciliação com outros direitos constitucionalmente protegidos, com afloração no artigo 57º, nº 3, da Constituição da Republica, sendo que as associações sindicais e os trabalhadores em greve devem assegurar a prestação dos serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, e sempre que a greve se realize em empresa incluída em algum dos sectores previstos neste art.º 598º, nº 2, que portanto se consideram satisfazer as tais ‘necessidades sociais impreteríveis’, deve o pré-aviso respectivo, dirigido pela entidade sindical que decidiu do recurso à greve ao empregador ou associação de empregadores, e ao ministério responsável pela área laboral, conter desde logo uma proposta de definição de serviços mínimos – art.º 595º, nº 3, do Código do Trabalho porque não foi cumprido este normativo legal ?([7]) Qual vai ser a responsabilização dos “ditos gestores” que não previram esta situação e “permitiram” o incumprimento do serviço público? ([8]) Se para as empresas e para o Governo foi afectada a sua imagem pública, quais as consequências para os trabalhadores dessas empresas?

Como sabemos, no contrato de trabalho, a  greve suspende o contrato de trabalho, pelo que o trabalhador deixa de estar obrigado pelos deveres de subordinação e assiduidade (art.º 536º do Código do Trabalho), perdendo apenas o direito à retribuição e ao subsídio de refeição, assim há que verificar o seguinte, nomeadamente nestas empresas ( [9]):

  • Nº total de trabalhadores da empresa, incluindo as respectivas participadas;
  • Valor total dos salários incluindo subsídios e todas as remunerações acessórias, pagos mensalmente;
  • Nº de trabalhadores que aderiram á greve; (percentagem que foi previamente anunciada);
  • Nº de trabalhadores a quem foi descontado o dia de trabalho, incluindo a parte das remunerações acessórias e o subsidio de refeição e respectivo valor;
  • Nº de “trabalhadores-sindicalistas” pagos pela empresa

Será muito “interessante” constarmos, com excepção da Carris, em todas estas empresas, que foi muito diminuto, segundo sabemos de ouvir dizer, que a menos de uma centena de trabalhadores vai “ver descontado o dia de greve”, isto é, foi a “própria empresa, com conivência clara dos seus responsáveis que “paga o dia de greve”. A confirmar-se esta “escandalosa situação”, não será este motivo suficiente para a substituição – demissão com justa causa – destes “gestores”? Será que o Governo não vai “denunciar” esta inqualificável situação que se pode tipificar entre outras situações como de administração danosa? ( [10])
Tratam-se de uma situações “chocante” que prolifera com elevados custos que acarretam, resultantes não só da “impreparação para assumir tais cargos”, mas também da “inadequação funcional” que continuam a ser suportados por este sector empresarial do estado - não podemos esquecer que é a falta de eficácia e eficiência na acção politica que conduz a uma progressiva falta de credibilidade da gestão pública.([11])
 Segundo lemos na imprensa a propósito das greves (Setembro 2016) no serviço publico fluvial de transporte de passageiros, “ os trabalhadores recusam ser responsabilizados pela degradação do serviço destas duas empresas, já que isso é a consequência das políticas do governo anterior e da falta de iniciativa do actual, de que resulta a imobilização de parte da frota, falta de trabalhadores, o que conduz à redução da oferta de serviço aos utentes Os trabalhadores recusam ser o “bode expiatório” das consequências de uma política de destruição do serviço pública promovida pelo governo anterior e da falta de vontade e/ou incapacidade do actual em resolver os problemas que estão a provocar a degradação do serviço aos utentes, só como exemplo, no período de verão (até ontem) foram suprimidos 556 serviços no conjunto das duas empresas. A resolução passa pelo libertar das verbas necessárias que permitam resolver a imobilização de quase metade da frota das duas empresas, pela admissão dos trabalhadores necessários, pela passagem a efectivos dos contratados pelas empresas de trabalho temporário e pela reposição e negociação da contratação colectiva. “ (Isto é a ser verdadeiro o dado da supressão de carreiras, revela algo catastrófico, o de que comparado com 2001 terão sido “suprimidas mais de 1000 ligações entre as duas margens!!!);

“Para ter um negócio de sucesso, alguém, algum dia, teve que tomar uma atitude de coragem.” (Peter Drucker)

(continua)




[1]  Entre os diversos acórdãos e jurisprudência sobre esta matéria deixamos aqui apenas estes dois: Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa 28.03.2012
(http://www.dgsi.pt/jtrl1.nsf/0/50a92964495be7a1802579d7002fbc70?OpenDocument)
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa 07.12.2010
http://www.dgsi.pt/jtrl1.nsf/0/9baa9fab33efd2b280257818005483d2?OpenDocument
[2]  Constituição da República Portuguesa, Anotada, volume I, Coimbra Editora, 2007, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, p. 757).
[3]  Novembro de 2011 e Novembro de 2010
[4]  "Os serviços mínimos são um aspecto que está consagrado na lei. Tenho a certeza que todos os sindicatos vão respeitar", respondeu primeiro ministro que disse mesmo não ter nenhuma indicação que seja necessário ao Governo proceder a medidas de requisição civil em algum sector.  "No entanto, se for necessário, fá-lo-emos, porque a lei da greve consagra o direito à greve, respeitando também a liberdade de terceiros no sentido de poderem ser atendidos. Por isso, os serviços mínimos servem para defender o interesse geral", declarou.  Em relação à greve geral de quarta-feira, o primeiro-ministro disse que "neste país respeita-se o direito à greve".

[5]  Entre 1996-2001 estas situações “aconteceram com toda a normalidade da acção sindical, resultante da visão politica que se tem que aceitar em democracia”, nunca alguma vez se ficou sem transportes alternativos. Fomos responsáveis entre 1996-2001 na Transtejo e nunca os cidadãos ficaram sem ter transporte fluvial, nem sequer houve recurso a outros meios de transporte, nem sequer houve necessidade de “declaração dos serviços mínimos”).
[6]  Sendo possível que a mesma situação de encerramento tenha acontecido nas restantes empresa, com excepção da Carris. Será  que os detentores dos cargos de gestão, na sua maior parte, estão lá para criarem dificuldades e não para encontrar soluções adequadas a cada empresa?
[7]  Se é verdade que participar numa greve é um direito democrático, não participar e ir trabalhar é igualmente um direito democrático. Paralisar o país, paralisando os transportes públicos e obrigando as pessoas a ficar em casa, tira-lhes este direito de ir trabalhar
[8]   “A Carris, CP, Metro do Porto, Metro de Lisboa, Refer, STCP e Transtejo acumulam dívidas de €17,27 mil milhões (2010). Só o passivo da CP e da Refer ascende quase a €10 mil milhões. Os trabalhadores das empresas públicas de transportes continuam a fazer greves contra os cortes salariais
[9]  O sector de transporte público colectivo de passageiros inclui as empresas totalmente detidas pelo Estado: a Companhia Carris de Ferro de Lisboa, S.A.; a CP-Caminhos de Ferro Portugueses, E.P.; o Metropolitano de Lisboa, E.P. (ML); a STCP-Sociedade de Transportes Colectivos do Porto, S.A. e a Transtejo-Transportes do Tejo, S.A., a REFER e a Soflusa, e Porto de Sines (deve incluir-se também as inúmeras participadas, “resultado da criatividade imaginativa de arranjar lugares de administração”).

[10]  (responsabilidade de gestão da “coisa pública”) existem na nossa jurisprudência decisões no sentido de que o tipo legal do “crime de administração danosa admite o dolo directo”, sustentando-se, com base na utilização da expressão “intencionalmente”, que o legislador “pretendeu excluir o dolo eventual, pois não se compreenderia que uma actuação que envolve permanentemente riscos de prejuízos e o assumir da possibilidade de prejuízos pudesse ser submetida ao n.º 3 do artigo 14º do Código Penal, sob pena de ser paralisada a vida económica” (Ac. STJ 24/02/94, BMJ 434, pg.369; cfr. tb. Ac. STJ 11/02/98, CJSTJ, 1, pg.199). Julga-se, porém, que, tal como explica M. Costa Andrade (op. cit., pg.552), somente em relação à violação “das normas de controlo ou regras económicas” se exige uma específica intenção, já que, em relação ao resultado típico, não existindo qualquer limitação, o dolo determinar-se-á segundo os critérios e os princípios gerais e, logo, é admissível o dolo em qualquer das suas formas - directo, necessário ou eventual (cfr. artigo 14º do Código Penal). Destes factos resulta que a nossa jurisprudência distingui duas coisas: a intencionalidade dos factos praticados da intencionalidade das consequências desses mesmos factos.
[11]  “Quer se concorde ou não, é inadmissível que o “ movimento grevista, iniciado em Novembro passado, registando diversas greves programadas de forma sucessiva, com modos específicos de execução", que vão desde o absentismo total ao trabalho, ao absentismo parcial e de curta duração, ou "apenas a determinadas tarefas com efeitos gravosos na prestação do serviço global das empresa, com prejuízos graves para a economia nacional e dos clientes", sem que não tenha até esta data, num sector público de actividade, cujo endividamento, referido apenas a sete empresas, já ultrapassa os 17,4 mil milhões de euros, merecido uma estratégia de resposta efectiva por parte das administrações das referidas empresas – a greve é um direito com garantia constitucional, mas também o é um direito ao trabalho – como é possível que os administradores destas empresas não cumpram a sua missão de garantir o pleno funcionamento de um serviço publico essencial para os cidadãos? Como é que se pode “assistir ao encerramento das portas do Metropolitano de Lisboa, sem que se apure as responsabilidades por este acto de autêntico “terrorismo politico-sindical”? A propósito das “greves que encerraram o Metro e a Transtejo/Soflusa”fiquei a aguardar qual iria ser a posição do Governo perante o incumprimento da Lei e o apuramento de responsabilidades dos “gestores públicos”, que foram incapazes de prever tais situações de incumprimento, por um lado e por outro a permissão de “encerramento da própria empresa prestadora de um serviço público”, contribuindo deste modo para a degradação da imagem da própria acção governativa. MAS ATÉ HOJE NENHUMA DECISÃO FOI TOMADA”.

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