PASSOS
COELHO OU UM MENTIROSO COMPULSIVO!
“Chamar hoje mentiroso a Passos Coelho, já não tem qualquer
carácter ofensivo, pois trata-se de um facto devidamente comprovado.”
Passos Coelho, numa “acção
propagandista” foi entrevistado esta terça-feira pela SIC, na pretensão de
fazer um balanço do seu Governo. O jornal de Negócios seleccionou algumas das
frases de Passos Coelho e foi tentar perceber se o mesmo falou verdade. ([i]
)
Porque se trata de “um jornal”
claramente “afecto” a Passos Coelho, tornou-se muito interessante poder
constatar até onde vai este “individuo” que “capturou” o lugar de primeiro
ministro de Portugal.
1. Passos
Coelho (PC):
Sem acordo, o BCE estava impedido de ceder liquidez aos bancos gregos e Grexit
seria inevitável. "Se um acordo não vier a ser
obtido" o "BCE estaria impedido estatutariamente de ceder mais
liquidez aos bancos gregos. O que significa isto? Que deixaria de haver circulação
monetária na Grécia. O que é que um estado na ausência de moeda pode fazer para pagar
salários e etc.? Seria inevitável: se não houvesse acordo teríamos de acordar
com o governo grego os termos para que se pudesse criar uma moeda
alternativa".
Resposta completamente falsa, pois a verdade é que “os limites exactos da capacidade do
BCE de ceder liquidez de emergência não
são claros, pois dependem da análise da solvabilidade dos bancos, que é um
conceito que avalia a evolução esperada de activos e passivos no longo prazo. A
instituição deixou no entanto claro que, sem acordo e incumprimento por parte
do Estado grego nas suas dívidas, entenderia que não teria condições de
continuar a emprestar dinheiro aos bancos, uma vez que os consideraria
insolventes. Neste cenário, uma saída da Grécia da Zona Euro, embora provável –
e promovida como hipótese pelo Governo alemão – não seria inevitável. Restava a
possibilidade de resolver e fechar as actuais instituições financeiras gregas e
promover a sua recapitalização, se necessário com dinheiro europeu. Uma vez
recapitalizadas as instituições, o BCE poderia voltar a emprestar dinheiro. No
fundo, tratar-se-ia de um incumprimento dentro da Zona Euro. A probabilidade
de, pelo menos temporariamente, os gregos terem de imprimir notas promissórias,
seria grande.
2. Passos
Coelho (PC): O plano para a Grécia
estava a dar resultado antes de vir o Syriza. "A Grécia tinha conseguido uma primeira
emissão em mercado no ano passado, bom indício de que estava a recuperar, o
emprego tinha crescido um bocadinho, estava com excedente primário de bons
resultados este ano, e durante todos estes meses a situação foi-se
deteriorando, de tal maneira que há cerca de 3, 4 semanas, em vez de discutir
programa de 20 mil, agora discutimos programa de 3 anos de até 86 mil milhões"
Resposta completamente falsa, pois a realidade é que ao longo de
2014, houve algumas emissões de dívida
bem-sucedidas, mas o acesso regular e estável ao mercado não estava garantido.
Os juros da dívida a 10 anos estiveram perto dos 5% em Setembro, mas aproximaram-se
dos 9% em meados de Dezembro, reagindo à antecipação de instabilidade política que resultou das
dificuldades do anterior governo em cumprir o acordado com a troika. O mau
desempenho das exportações foi acompanhado de uma queda acentuada das importações
durante cinco anos consecutivos, o que permitiu um excedente externo ao país. É
uma das vitórias da troika, mas que foi acompanhado de um colapso da economia.
Em 2014, a economia grega cresceu 0,8%, após seis anos consecutivos de recessão.
Contudo, no último trimestre do ano, os indicadores voltaram a trazer más
notícias,
já que, segundo dados
reportados pelo Eurostat, o crescimento em cadeia foi negativo (-0,2%). Mais, o
registo de 0,8% surgiu depois de uma queda de cerca de 25% do Produto Interno
Bruto do país, entre 2009 e finais de 2014.
Um dos indicadores que maior preocupação
suscitava, e continua a suscitar, é
peso da dívida pública.
Desde o FMI às instituições
europeias, algum tipo de reestruturação tem sido apontada como incontornável.
Relembre-se que a Grécia
operou em 2012 a maior reestruturação de dívida pública da história, mas em
finais de 2014 estava acima dos 170% do PIB. Em 2009, o valor da dívida pública
estava nos 130%. Depois de atingir níveis de desemprego histórico, em finais de
2014 a taxa correspondente era, apesar de uma ligeira recuperação, ainda
superior a 25% da população activa, superando os 50% entre a população jovem.
Lembre-se que, ao longo do programa de assistência, o país viu o número de
habitantes cair, tal como o número de empregos. Desde 2009, segundo os dados do
FMI, a Grécia perdeu 150 mil residentes (-1,3%) para cerca de 11 milhões de
habitantes, e destruiu 850 mil empregos (-18%) para os 3,75 milhões.
3. Passos
Coelho (PC): O sistema previdencial público é deficitário.
“Temos
um problema com os sistemas previdenciais públicos, eles são deficitários. Não vale fazer de conta que não é assim,
já em 2013 e 2014 tivemos de fazer transferências adicionais do Orçamento do Estado para a Segurança
Social para que pudesse cumprir as suas funções”.
Resposta completamente falsa, pois a realidade é que tirando anos pontuais de desequilíbrio,
o sistema previdencial de Segurança
Social foi sendo superavitário, até à crise,
altura em que descarrilou. 2012 foi o ano da viragem, fruto do aumento em
flecha do desemprego, da recessão económica, e da compressão salarial. Menos
empregos e salários mais baixos são sinónimos de
menos contribuições e
mais subsídios de desemprego. De 2012 para cá, o défice repetiu-se ano após
ano, esperando-se que este ano ronde os 900 milhões de euros. Nestes exercícios,
o Governo tem optado por cobrir os buracos com transferências do Orçamento do Estado, e não
beliscar o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, que funciona
como uma reserva de emergência
para pagar pensões.
Quanto ao futuro, as poucas projecções
de médio e longo prazo até
agora conhecidas, nomeadamente as feitas pelo economista Jorge Bravo por
encomenda do Governo, que pagou “principescamente este parecer”, apontam para
que o sistema não se volte a recompor e acumule défices
consecutivos e portanto de pouca credibilidade técnica.
Já no que respeita à Caixa Geral de Aposentações, o Estado
tem e continuará a ter de fazer transferências do Orçamento do Estado para pagar parte das pensões.
Ao todo, em 2014, a CGA pagou cerca de 9,5 mil milhões em pensões, 45% dos
quais foram financiadas por quotas dos actuais funcionários
públicos, e 40% dos quais
pelo OE. Contudo, tal deve-se, pelo menos em parte, ao modelo escolhido pelos
sucessivos governos para financiar este sistema. Por um lado, durante
anos a fio os organismos públicos não tinham de fazer descontos para a CGA,
enquanto entidade patronal, porque se entendia que o Estado é só um e, na prática,
não faria diferença serem os organismos a pagar individualmente ou o Orçamento
a pagar tudo no conjunto – isto criou um subfinanciamento na conta-corrente da
CGA. Mais recentemente, em 2006, resolveu fechar-se a CGA, e todos os funcionários
públicos passaram a
descontar para a Segurança Social, o que faz com que o número de activos a
descontar e as receitas do sistema sejam cada vez menores, e o Estado tenha de
entrar com parcelas maiores de financiamento.
4. Passos
Coelho (PC): Contas
do memorando original estavam mal feitas e programa era incumprível. “Quando eu o recebi, o programa não era cumprível. As contas estavam
mal feitas e não fui eu que as fiz. Constavam do memorando assinado entre o
Governo e troika”. “Dizia que
nós em 2011 tínhamos de alcançar um défice de 5,9%. Sabe qual era o
défice no dia que tomei posse, de acordo com o INE? Era de 9%. O nosso
objectivo era de 5,9%. A perspectiva associada ao memorando era que partiríamos
de 2010 de um défice que podia rondar entre 7,5% e 8%. O défice de 2010 foi 10%”.
Resposta completamente falsa, pois a realidade Passos
Coelho refere que os valores previstos para o défice acabaram por ser bastante
superiores ao que estava previsto no memorando (a saber: 5,9% em 2011, 4,5% em
2012 e 3% em 2013). Isso é verdade, embora a derrapagem do défice de 2010 tenha
tido várias causas: o primeiro aumento, em Março de 2011, fez o défice escalar
para 8,6%, devido ao impacto do BPN, BPP e à reclassificação de três empresas públicas (sem estes
efeitos, disse o INE, o défice seria de 6,8%, abaixo dos 7,3% previstos pelo
Governo). No mês
seguinte, nova revisão, de 8,6% para 9,1%, por causa da inclusão dos contratos
de três parcerias público-privadas
(PPP) e, finalmente, houve uma subida para 9,8%, no final do ano, por causa da
inclusão do célebre “buraco
da Madeira”.
Posteriormente,
quando o INE reviu as regras estatísticas, no final do ano passado, o défice de
2010 até passou a ser de
11,2%.
Quando Passos tomou posse, em Junho de 2011, o
défice que tinha sido apurado era efectivamente de 9,1%. Um número
que já era conhecido em
Abril – precisamente para disponibilizar "dados estáveis para 2010, que
constituíssem o ponto de partida para as negociações em curso", disse então
o INE, citado pelo Público. Portanto, quando Passos diz que se esperava que o défice
estivesse entre 7,5% e 8%, tal não é verdadeiro.
O primeiro-ministro esquece-se,
adicionalmente, de referir que o PSD esteve envolvido nas negociações do memorando
original, através de Eduardo Catroga, que foi escolhido precisamente por Passos
Coelho, quando este era apenas presidente do PSD. Nessa altura, o PSD reclamou
que foi da sua responsabilidade a subida do objectivo do défice para os três anos do programa, face às metas que estavam estabelecidas no
PEC IV (4,6%, 3% e 2% para 2011, 2012 e 2013, respectivamente).
Essa revisão foi uma “grande vitória” do PSD, disse então o ex-ministro das
Finanças. Catroga acrescentou ainda que a negociação foi “essencialmente
influenciada pelo principal partido de oposição” e que a troika percebeu a “estratégia diferenciadora” dos social-democratas. Portanto, se as
contas foram mal feitas, como diz Passos, o seu partido podia ter dado o alerta.
Passos
Coelho (PC): Governo criou 175 mil empregos entre
Janeiro de 2013 e Abril de 2015, a maioria com vínculo permanente. “Nos primeiros anos [da legislatura] tivemos
um agravamento do desemprego, um problema com o emprego, mas a partir de 2013
uma melhoria. Entre Janeiro de 2013 e Abril de 2015, vimos a economia criar
mais de 175 mil postos de trabalho, temos mais pessoas empregadas hoje do que
em 2013”. O emprego existe “em melhores condições”. “Por cada empregado com
contrato a termo, há três
com contrato sem termo. A precariedade diminuiu ao contrário do que muitas
vezes se apregoa”.
Resposta completamente falsa,
pois a realidade Os
dados do INE mostram que, entre o quarto trimestre de 2012 e o primeiro
trimestre de 2015, foram criados 40 mil empregos. Se a comparação começar no primeiro trimestre de 2013, os
números são mais
simpáticos, mas ainda longe dos valores enunciados pelo líder do Governo: 123
mil. A única forma de nos aproximarmos desses valores é utilizar dados mensais.
Um indicador mais frágil e muito mais flutuante, pouco utilizado para ilustrar
a evolução do mercado de trabalho. Ainda assim, se compararmos Janeiro de 2013 –
o pior mês
de sempre desde 1998 – com Abril de 2015, a criação de emprego até ultrapassa o
que disse Passos na entrevista: 205 mil.
Independentemente dos parágrafos
anteriores, talvez o mais importante para avaliar a afirmação do
primeiro-ministro seja o que aconteceu ao emprego antes do início de 2013,
quando o PSD e o CDS-PP já eram Governo. Entre o primeiro trimestre de 2011 e o
primeiro trimestre de 2013, 420 mil pessoas deixaram de estar a
trabalhar em Portugal. O
que significa que os 123 mil empregos criados são menos de um terço dos destruídos
no período anterior. Um saldo negativo de 298 mil.
Quanto à afirmação de que por cada contrato a
prazo há dois sem termo, essa proporção não existe desde a tomada de posse
desde Governo. Os contratos sem termo já rondavam os 77%/78% do emprego por
conta de outrem. O que se assistiu durante a crise foi, isso sim, a uma destruição
muito superior dos postos de trabalho mais precários
(contratos a prazo e recibos verdes) devido a uma maior facilidade de despedimento
que, ainda assim, não
mudou a “relação de forças”
entre o tipo de vínculo.
Passos Coelho (PC): : Entre 2005 e 2011, foram destruídos 236 mil
empregos. “Entre 2005 e 2011, que foi rigorosamente o período em que o PS esteve
no Governo, a economia perdeu cerca de 236 mil empregos. Perdeu-os”. “A taxa de
desemprego em 2005, quando o PS chegou ao Governo, era de 7,5%. Quando eu
cheguei era de 12,1%. Enquanto o PS foi Governo a taxa de desemprego subiu”
Resposta completamente falsa,
pois a realidade Mais
uma vez, os números não
correspondem aos dados disponibilizados pelo INE. Porém, neste caso, o
primeiro-ministro parece ter dramatizado menos a realidade. Entre o primeiro
trimestre de 2005 e o primeiro trimestre de 2011 foram destruídos 254 mil
postos de trabalho. Se olharmos para dados anuais, entre 2005 e 2011, o emprego
sofreu uma contracção de 322 mil. De referir que todos estes valores sofrem de
problemas de comparação, uma vez que se verificou uma quebra de série entre
2010 e 2011. Onde Passos Coelho pintou uma realidade menos simpática para o
Partido Socialista foi na taxa de desemprego. Quando o Governo tomou posse em
2005 a taxa de desemprego era 8,4% (primeiro trimestre de 2005). Quando o PSD e
o CDS se tornaram Governo ela estava nos 12,2% (primeiro trimestre de 2011).
Estes valores do Eurostat são ajustados a sazonalidade. Os valores não
ajustados são 8,7% e 12,6%, respectivamente.
[i] http://www.jornaldenegocios.pt/economia/politica/detalhe/as_respostas_na_entrevista_de_passos_coelho_sao_verdadeiras_ou_falsas.html#.VabQ_ryD3HM.facebook
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