Como é que o senhor presidente da República não sabia os preceitos constitucionais que terá de obedecer um Governo de Gestão?
Um governo de gestão exerce funções durante um período de tempo reduzido. Por norma, actua durante o intervalo entre a demissão de um governo e a escolha de um novo governo, seja através de eleições legislativas ou da formação de um novo governo pelo Presidente da República. O governo de gestão tem competências administrativas e legislativas, de forma a manter a gestão do funcionamento do Estado e pode aplicar medidas de redução de despesa, como a contenção de gastos nos serviços integrados e nos serviços com autonomia financeira, como por exemplo os gastos com consumos intermédios. É assim um executivo limitado nas funções, podendo praticar actos correntes de administração diária.No entanto, não pode avançar com decisões que envolvam aumentos de impostos, cortes em determinados apoios sociais, que necessitam de apoio do Parlamento, ou decisões de investimento a mais longo prazo e concursos públicos.
Só o Presidente da República continua a exercer plenamente as suas funções, dado que quer o Governo, que foi demitido, quer a Assembleia da República que foi dissolvida estão em meros actos de gestão nos termos Constitucionais. Eis o que diz a Constituição da República: “Governo de gestão” que deve limitar-se, nos termos constitucionais, à prática dos actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos, artigo 186.º, nº 5; da CRP.
Torna-se claro que um eventual pedido de ajuda externa ao FMI por parte do Estado Português envolveria uma negociação de condições, que ultrapassaria as competências de um Governo de gestão."Uma ajuda externa significa um afastamento do país dos quadros de financiamento internacional durante vários anos" e levaria "a adopção de um programa necessariamente de austeridade muito mais exigente do que aquele que tem sido aplicado em Portugal, com consequências mais negativas para a economia e para as condições de vida dos portugueses.
São vários os pareceres que se ocupam dos aspectos materiais da competência legislativa do Governo, nomeadamente, face à delimitação constitucional das matérias reservadas à competência legislativa da Assembleia da República e do Governo. Sendo, porém, a competência legislativa da Assembleia da República a referência fundamental (cfr. artigos 164º e 165º da Constituição, na redacção introduzida pela revisão constitucional de 1997), remete-se para a anotação a ela referente, a análise das matérias relacionadas com a eventual invasão da competência legislativa da Assembleia da República pelo Governo. Vejam-se, designadamente, o parecer n.º 202/76, e as informações-pareceres nºs. 71/78, 72/78 e 144/79. Lamentavelmente o senhor presidente da república “esqueceu-se” que as autorizações de empréstimos fora da lei do orçamento revestem a forma de Lei, tal como as autorizações legislativas”, que nos termos constitucionais são de competência exclusiva da Assembleia da Republica.”
Alguns exemplos da actuação do FMI: Por exemplo, no sector público, em Portugal não existe nenhum programa de despedimentos sistemático na função pública, como está previsto no programa irlandês, com a redução prevista de 25 mil funcionários (com esta medida, a Irlanda pretende voltar ao número de funcionários de 2005; mas isto só acontece porque o país fez crescer o sector público entre 2005 e 2008, processo inverso ao que ocorreu em Portugal entre 2005 e 2009, onde houve uma diminuição ao abrigo da reforma da administração pública). Outro exemplo: acham mesmo que a redução de salários na função pública acima dos €1.500/mês em Portugal é equiparável ao corte do 13.º e do 14.º mês que sofreram os funcionários gregos, ou que a política de moderação salarial no sector privado em Portugal é o mesmo que o fim dos subsídios de férias e de Natal no mesmo país?
2) Depois, a entrada do FMI implicaria a imposição de ainda mais medidas, independentemente do facto de já várias delas já estarem a ser implementadas. Dado que o FMI não é propriamente a CGD, o recurso ao resgate só é possível num regime de forte condicionalismo, e levaria inevitavelmente a um acentuar da austeridade (fosse ela composta pelas mesmas medidas ou por outras novas). Basta lembrar que a Irlanda já tinha adoptado cinco pacotes de austeridade desde 2008 - ou seja, antes da entrada do FMI -, e que a intervenção deste levou a um intensificar das medidas, inscritas no National Recovery Plan 2011-2014. Também na Irlanda se podia dizer que o FMI "já lá tinha entrado" antes de Novembro de 2010, e mesmo assim a sua entrada levou a mais austeridade.
"O que é que é mais austeridade?" perguntam. Coisas como o corte de 30% no salário dos funcionários públicos, como aconteceu na Letónia (que pediu a ajuda do FMI em Dezembro de 2008), ou despedimento de mais dezenas de milhares de funcionários públicos, como aconteceu na Roménia (que pediu a ajuda em Abril de 2009), onde foram despedidos mais 100 mil, quase 10% do total. Ou a aplicação dos despedimentos individuais e dos contratos por “boca”?
Mas se o senhor presidente da República tem essa visão para Portugal, deve chamar os partidos políticos, exigir-lhe o compromisso público com a aplicação destas medidas e o compromisso em acordo escrito de que as mesmas seriam ratificadas e aprovadas pelos mesmos partidos políticos na primeira sessão normal da próxima assembleia da República, pois nos termos constitucionais só só o senhor presidente da republica tem essa competência. Ele que pediu rigor e verdade, não faça com frei Tomás.
Os que defendem que um governo de gestão pode pedir ajuda financeira internacional ou são ignorantes ou estão de má-fé, estão a esquecer deliberadamente que essa ajuda é negociada e tem como contrapartida decisões de ordem económica que nenhum governo de gestão poderia decidir. A não ser que o presidente Cavaco use dos seus limitados poderes e conhecimentos de economia para presidir a uma reunião do conselho de ministros onde essa ajuda fosse aprovada. Aqui fica a sugestão, que seja Cavaco a assumir a responsabilidade do pedido, a condução das negociações e adopção das medidas negociadas e exigir a sua aprovação pelos partidos que defendem a entrada do FMI nos termos atrás referidos.