PODE UM GOVERNO PRATICAR ACTOS SUCESSIVOS DE VIOLAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO?
A gravidade desta medida, a aplicação da sobretaxa de IRS, para além daquilo que tem de injusto e de imoral, é também de natureza jurídica, por violar a Constituição da República Portuguesa, em várias das suas disposições e princípios.
Estamos a assistir, quase todos os dias a actos do Governo, que de acordo com todos, não conhecemos nenhum constitucionalista favorável a tal medida, como todos sabemos o senhor” moedas” é engenheiros, sem qualquer desrespeito por estes profissionais, que vêm afirmando peremptoriamente:
1. A sobretaxa de IRS viola o princípio orçamental da tipicidade qualitativa das receitas, nos termos do qual não pode ser cobrado imposto diverso – ou diferente qualidade – do que se encontra autorizado na Lei do Orçamento de Estado.
2. A legislação que criou a sobretaxa viola o artº 165º e o artº 227º da CRP, porque não foram ouvidas as autarquias locais, em causa o principio da coerência, da participação das autarquias locais nos recursos públicos visando o equilíbrio financeiro vertical e horizontal, da coordenação das finanças locais com as estaduais.
3. Trata-se, também de um acto de violação do principio do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2º da Constituição, em conjugação com o princípio da igualdade decorrente do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 13º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 59º da Constituição, que reafirma o principio da igualdade numa vertente social;
4. Violação do direito fundamental à não redução do salário, cumpre ainda referir a circunstância de os salários dos trabalhadores da Administração Pública, que têm um regime próprio, beneficiarem de um regra de irredutibilidade geral dos mesmos, à semelhança do que sucede com as remunerações dos trabalhadores que se submetem ao Direito do Trabalho; (regra inscreve-se no direito infraconstitucional, tanto no Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (artigo 89.º, alínea d)), como no Código do Trabalho (artigo 129.º, n.º 1, alínea d)
5. Mencionar o facto de esta legislação laboral que reduziu os salários não ter sido devidamente precedida pelas obrigatórias consultas às entidades representativas dos trabalhadores, sendo certo que a lei orçamental tem o mesmo regime, neste ponto, das outras leis. É isso o que se dispõe nos arts. 54.º, n.º 5, al. d), e 56.º, n.º 2, al. a), da Constituição, e também no art. 134° do Regimento da Assembleia da República, pelo que se trata de legislação inconstitucional por preterição dessa audição, pacificamente considerada obrigatória pelo próprio Tribunal Constitucional;
6. Violação do princípio da protecção da confiança ínsito no princípio do Estado de Direito, tal como surge plasmado no artigo 2.º da Constituição. Sustentam que a medida não tem justificação material suficiente e que a redução é arbitrária "porque, sendo permanente, ela assenta num pressuposto que é temporário, que é o pressuposto da crise económico-financeira que grassa no país". A protecção da confiança traduz a incidência subjectiva da tutela da segurança jurídica, representando ambas, em concepção consolidadamente aceita, uma exigência indeclinável (ainda que não expressamente formulada) de realização do princípio do Estado de direito democrático (artigo 2.º da CRP).
Na sua perspectiva, é um confisco, "uma vez que os salários das pessoas são confiscados pelo Estado que unilateralmente se recusa a cumprir os compromissos que perante estas assumiu sem, porém, declarar a bancarrota, que afectaria todos os credores por igual". Mas mesmo que se lhe chame "imposto", viola "não apenas a igualdade tributária", como a "própria universalidade do imposto, ao criar um encargo fiscal que recai apenas sobre uma categoria de cidadãos" (funcionários públicos) (prof. Doutor Meneses Leitão)
O professor catedrático deu outros exemplos de decisões que violam a Constituição, por parte do Tribunal Constitucional, e acusou este órgão de não desempenhar o seu papel. "O nosso Tribunal Constitucional prossegue antes outras funções: uma função de legitimação política de actos legislativos suspeitos de inconstitucionalidade e uma função de controlo das decisões dos outros tribunais que pretendam exercer a fiscalização difusa da constitucionalidade”
OU SERÁ QUE ESTE GOVERNO “DECRETOU MESMO A SUSPENSÃO DA NOSSA CONSTITUIÇÃO?
CONSTITUIÇÃO DA RÉPUBLICA PORTUGUESA
Artigo 19.º
(Suspensão do exercício de direitos)
1. Os órgãos de soberania não podem, conjunta ou separadamente, suspender o exercício dos direitos, liberdades e garantias, salvo em caso de estado de Sítio ou de estado de emergência, declarados na forma prevista na Constituição.
2. O estado de Sítio ou o estado de emergência só podem ser declarados, no todo ou em parte do território nacional, nos casos de agressão efectiva ou iminente por forças estrangeiras, de grave ameaça ou perturbação da ordem constitucional democrática ou de calamidade pública.
3. O estado de emergência é declarado quando os pressupostos referidos no número anterior se revistam de menor gravidade e apenas pode determinar a suspensão de alguns dos direitos, liberdades e garantias susceptíveis de serem suspensos.
4. A opção pelo estado de Sítio ou pelo estado de emergência, bem como as respectivas declaração e execução, devem respeitar o princípio da proporcionalidade e limitar-se, nomeadamente quanto às suas extensão e duração e aos meios utilizados, ao estritamente necessário ao pronto restabelecimento da normalidade constitucional.
5. A declaração do estado de Sítio ou do estado de emergência é adequadamente fundamentada e contém a especificação dos direitos, liberdades e garantias cujo exercício fica suspenso, não podendo o estado declarado ter duração superior a quinze dias, ou à duração fixada por lei quando em consequência de declaração de guerra, sem prejuízo de eventuais renovações, com salvaguarda dos mesmos limites.
6. A declaração do estado de Sítio ou do estado de emergência em nenhum caso pode afectar os direitos à vida, à integridade pessoal, à identidade pessoal, à capacidade civil e à cidadania, a não retroactividade da lei criminal, o direito de defesa dos arguidos e a liberdade de consciência e de religião.
7. A declaração do estado de Sítio ou do estado de emergência só pode alterar a normalidade constitucional nos termos previstos na Constituição e na lei, não podendo nomeadamente afectar a aplicação das regras constitucionais relativas à competência e ao funcionamento dos órgãos de soberania e de governo próprio das regiões autónomas ou os direitos e imunidades dos respectivos titulares.
8. A declaração do estado de Sítio ou do estado de emergência confere às autoridades competência para tomarem as providências necessárias e adequadas ao pronto restabelecimento da normalidade constitucional.