Por António Bagão Félix
Aprovado o OE 2013, Portugal arrisca-se a entrar no
"Guinness Fiscal" por força de um muito provavelmente caso único no
planeta: a partir de um certo valor (1350 euros mensais), os pensionistas vão
passar a pagar mais impostos do que outro qualquer tipo de rendimento,
incluindo o de um salário de igual montante! Um atropelo fiscal
inconstitucional, pois que o imposto pessoal é progressivo em função dos
rendimentos do agregado familiar [art.º 104.º da CRP], mas não em função da
situação activa ou inactiva do sujeito passivo e uma grosseira violação do
princípio da igualdade [art.º 13.º da CRP].
Por exemplo, um reformado com uma pensão mensal de
2200 euros pagará mais 1045 € de impostos do que se estivesse a trabalhar com
igual salário (já agora, em termos comparativos com 2009, este pensionista viu
aumentado em 90% o montante dos seus impostos e taxas!).
Tudo isto por causa de uma falaciosamente denominada "contribuição extraordinária de solidariedade" (CES), que começa em 3,5% e pode chegar aos 50%. Um tributo que incidirá exclusivamente sobre as pensões. Da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações. Públicas e privadas. Obrigatórias ou resultantes de poupanças voluntárias. De base contributiva ou não, tratando-se por igual as que resultam de muitos e longos descontos e as que, sem esse esforço contributivo, advêm de bónus ou remunerações indirectas e diferidas.
Nas pensões, o Governo resolveu que tudo o que mexe leva! Indiscriminadamente. Mesmo - como é o caso - que não esteja previsto no memorando da troika.
Tudo isto por causa de uma falaciosamente denominada "contribuição extraordinária de solidariedade" (CES), que começa em 3,5% e pode chegar aos 50%. Um tributo que incidirá exclusivamente sobre as pensões. Da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações. Públicas e privadas. Obrigatórias ou resultantes de poupanças voluntárias. De base contributiva ou não, tratando-se por igual as que resultam de muitos e longos descontos e as que, sem esse esforço contributivo, advêm de bónus ou remunerações indirectas e diferidas.
Nas pensões, o Governo resolveu que tudo o que mexe leva! Indiscriminadamente. Mesmo - como é o caso - que não esteja previsto no memorando da troika.
Esta obsessão pelos reformados assume, nalguns
casos, situações grotescas, para não lhes chamar outra coisa. Por exemplo, há
poucos anos, a Segurança Social disponibilizou a oferta dos chamados
"certificados de reforma" que dão origem a pensões complementares
públicas para quem livremente tenha optado por descontar mais 2% ou 4% do seu
salário. Com a CES, o Governo decide fazer incidir mais impostos sobre esta
poupança do que sobre outra qualquer opção de aforro que as pessoas pudessem
fazer com o mesmo valor... Ou seja, o Estado incentiva a procura de um regime
público de capitalização (sublinho, público) e logo a seguir dá-lhe o golpe
mortal. Noutros casos, trata-se - não há outra maneira de o dizer - de um
desvio de fundos através de uma lei: refiro-me às prestações que resultam de
planos de pensões contributivos em que já estão actuarialmente assegurados os
activos que caucionam as responsabilidades com os beneficiários. Neste caso, o
que se está a tributar é um valor que já pertence ao beneficiário, embora este
o esteja a receber diferidamente ao longo da sua vida restante. Ora, o que vai
acontecer é o desplante legal de parte desses valores serem transferidos
(desviados), através da dita CES, para a Caixa Geral de Aposentações ou para o
Instituto de Gestão Financeira da S. Social! O curioso é que, nos planos de
pensões com a opção pelo pagamento da totalidade do montante capitalizado em
vez de uma renda ou pensão ao longo do tempo, quem resolveu confiar recebendo
prudente e mensalmente o valor a que tem direito verá a sua escolha ser
penalizada. Um castigo acrescido para quem poupa.
Haverá casos em que a soma de todos os tributos numa cascata sem decoro (IRS com novos escalões, sobretaxa de 3,5%, taxa adicional de solidariedade de 2,5% em IRS, contribuição extraordinária de solidariedade (CES), suspensão de 9/10 de um dos subsídios que começa gradualmente por ser aplicado a partir de 600 euros de pensão mensal!) poderá representar uma taxa marginal de impostos de cerca de 80%! Um cataclismo tributário que só atinge reformados e não rendimentos de trabalho, de capital ou de outra qualquer natureza! Sendo confiscatório, é também claramente inconstitucional. Aliás, a própria CES não é uma contribuição. É pura e simplesmente um imposto. Chamar-lhe contribuição é um ardil mentiroso. Uma contribuição ou taxa pressupõe uma contrapartida, tem uma natureza sinalagmática ou comutativa. Por isso, está ferida de uma outra inconstitucionalidade. É que o já citado art.º 104.º da CRP diz que o imposto sobre o rendimento pessoal é único.
Haverá casos em que a soma de todos os tributos numa cascata sem decoro (IRS com novos escalões, sobretaxa de 3,5%, taxa adicional de solidariedade de 2,5% em IRS, contribuição extraordinária de solidariedade (CES), suspensão de 9/10 de um dos subsídios que começa gradualmente por ser aplicado a partir de 600 euros de pensão mensal!) poderá representar uma taxa marginal de impostos de cerca de 80%! Um cataclismo tributário que só atinge reformados e não rendimentos de trabalho, de capital ou de outra qualquer natureza! Sendo confiscatório, é também claramente inconstitucional. Aliás, a própria CES não é uma contribuição. É pura e simplesmente um imposto. Chamar-lhe contribuição é um ardil mentiroso. Uma contribuição ou taxa pressupõe uma contrapartida, tem uma natureza sinalagmática ou comutativa. Por isso, está ferida de uma outra inconstitucionalidade. É que o já citado art.º 104.º da CRP diz que o imposto sobre o rendimento pessoal é único.
Estranhamente, os
partidos e as forças sindicais secundarizaram ou omitiram esta situação de
flagrante iniquidade. Por um lado, porque acham que lhes fica mal defender
reformados ou pensionistas desde que as suas pensões (ainda que contributivas)
ultrapassem o limiar da pobreza. Por outro, porque tem a ver com pessoas que já
não fazem greves, não agitam os media, não têm lobbies organizados.
Pela mesma lógica, quando se fala em redução da despesa pública há uma concentração da discussão sempre em torno da sustentabilidade do Estado social (como se tudo o resto fosse auto-sustentável...). Porque, afinal, os seus beneficiários são os velhos, os desempregados, os doentes, os pobres, os inválidos, os deficientes... os que não têm voz nem fazem grandiosas manifestações. E porque aqui não há embaraços ou condicionantes como há com parcerias público-privadas, escritórios de advogados, banqueiros, grupos de pressão, estivadores. É fácil ser corajoso com quem não se pode defender.
Foi lamentável que os deputados da maioria (na qual
votei) tenham deixado passar normas fiscais deste jaez mais próprias de um
socialismo fiscal absoluto e produto de obsessão fundamentalista,
insensibilidade, descontextualização social e estrita visão de curto prazo do
ministro das Finanças. E pena é que também o ministro da Segurança Social não
tenha dito uma palavra sobre tudo isto, permitindo a consagração de uma medida
que prejudica seriamente uma visão estratégica para o futuro da Segurança
Social. Quem vai a partir de agora acreditar na bondade de regimes
complementares ou da introdução do "plafonamento", depois de ter sido
ferida de morte a confiança como sua base indissociável? Confiança que agora é
violada grosseiramente por ditames fiscais aos ziguezagues sem consistência,
alterando pelo abuso do poder as regras de jogo e defraudando irreversivelmente
expectativas legitimamente construídas com esforço e renúncia ao consumo.
Depois da abortada tentativa de destruir o
contributivismo com o aumento da TSU em 7%, eis nova tentativa de o fazer por
via desta nova avalanche fiscal. E logo agora, num tempo em que o Governo diz
querer "refundar" o Estado Social, certamente pensando (?) numa
cultura previdencial de partilha de riscos que complemente a protecção pública.
Não há rumo, tudo é medido pela única bitola de mais e mais impostos de um
Estado insaciável.
Há ainda outro efeito colateral que não pode ser ignorado, antes deve ser prevenido: é que foram oferecidos poderosos argumentos para "legitimar" a evasão contributiva no financiamento das pensões. "Afinal, contribuir para quê?", dirão os mais afoitos e atentos.
Este é mais um resultado de uma política de receitas "custe o que custar" e não de uma política fiscal com pés e cabeça. Um abuso de poder sobre pessoas quase tratadas como párias e que, na sua larga maioria, já não têm qualquer possibilidade de reverter a situação. Uma vergonha imprópria de um Estado de Direito. Um grosseiro conjunto de inconstitucionalidades que pode e deve ser endereçado ao Tribunal Constitucional.
Há ainda outro efeito colateral que não pode ser ignorado, antes deve ser prevenido: é que foram oferecidos poderosos argumentos para "legitimar" a evasão contributiva no financiamento das pensões. "Afinal, contribuir para quê?", dirão os mais afoitos e atentos.
Este é mais um resultado de uma política de receitas "custe o que custar" e não de uma política fiscal com pés e cabeça. Um abuso de poder sobre pessoas quase tratadas como párias e que, na sua larga maioria, já não têm qualquer possibilidade de reverter a situação. Uma vergonha imprópria de um Estado de Direito. Um grosseiro conjunto de inconstitucionalidades que pode e deve ser endereçado ao Tribunal Constitucional.
PS1: Com a antecipação em "cima da hora" da passagem da idade de aposentação dos 64 para os 65 anos na função pública já em 2013 (até agora prevista para 2014), o Governo evidencia uma enorme falta de respeito pela vida das pessoas. Basta imaginar alguém que completa 64 anos em Janeiro do próximo ano e que preparou a sua vida pessoal e familiar para se aposentar nessa altura. No dia 31 de Dezembro, o Estado, através do OE, vai dizer-lhe que, afinal, não pode aposentar-se. Ou melhor, em alguns casos até poderá fazê-lo, só que com penalização, que é, de facto, o que cinicamente se pretende com a alteração da lei. Uma esperteza que fica mal a um Governo que se quer dar ao respeito.
PS2: Noutro ponto, não posso deixar
de relevar uma anedota fiscal para 2013: uma larga maioria das famílias da
classe média tornadas fiscalmente ricas pelos novos escalões do IRS não
poderá deduzir um cêntimo que seja de despesas com saúde (que não escolhem,
evidentemente). Mas, por estimada consideração fiscal, poderão deduzir uns
míseros euros pelo IVA relativo à saúde... dos seus automóveis pago às oficinas
e à saúde... capilar nos cabeleireiros. É comovente...