O relatório elaborado pelo IGAL, como não podia deixar de ser, faz também uma “abordagem” do sistema e método da concessão dos subsídios, tendo concluído que:
- Pela inexistência de um processo organizado por cada entidade subsidiada;
- Inexistência de um regulamento municipal respeitante à atribuição de subsídios;
- Inexistência de um critério fixo para a determinação do valor do apoio a prestar a cada entidade;
Verificadas as violações destas normas legais, recomenda-se nesse relatório pela “elaboração de um regulamento municipal de atribuição de subsídios, por forma a clarificar quais os pressupostos e procedimentos adoptados pela autarquia mo que respeita à concessão de apoios a entidades particulares e a organização de processos, para cada uma das entidades subsidiadas, onde conste toda a documentação, nomeadamente, o pedido inicial e documentação de suporte”
Mas, todos sabemos que não raras vezes os agentes de entidades públicas actuam com manifesto abuso. Não há desculpas: a Lei, como o Sol, é para todos (convém também lembrar o art.º 22 CRP: Responsabilidade do Estado e Entidades Públicas).
As autarquias locais são pessoas colectivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respectivas – cf. artigo 235º, da Constituição da República Portuguesa. Ou seja, são pessoas colectivas públicas, visto serem criadas por iniciativa pública, que existem para assegurar a prossecução necessária de interesses públicos, e por isso dotadas em nome próprio de poderes e deveres públicos. Existem para atingir exclusivamente o interesse público, que se consubstancia no interesse da população do respectivo território. Ou seja, existem para satisfazer necessidades colectivas, pelo que fazem parte da Administração Pública e regem-se pelo direito administrativo, cujo principal ícone é o princípio da legalidade, que apenas permite que as pessoas colectivas públicas e os respectivos órgãos só possam actuar quando exista lei que o permita, é por isso que as atribuições e competências destas pessoas colectivas, têm que estar definidas na lei. A Lei nº 159/99, de 14 de Setembro, e a Lei nº 169/99 de 18 de Setembro, na redacção da Lei nº 5-A/2002 de 11 de Janeiro, são exemplo disso ao consagrarem respectivamente as atribuições e competências das autarquias locais.
Em causa está o princípio da imparcialidade, a que a Administração está vinculada, por força do disposto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP e do art.º 6.º do CPA.O princípio da imparcialidade constitui uma importante forma de garantir preventivamente, a imparcialidade da Administração. As garantias legais de imparcialidade funcionam como garantias da imagem e do bom nome da Administração ”conjurando, através de proibições, situações de perigo, em que, além da tentação que se oferece ao agente, pode germinar a suspeita pública relativamente à falta de isenção dos órgãos da administrativos. A protecção legal do bem jurídico imparcialidade alarga-se, assim, demarcando uma zona envolvente que se julga adequada a prevenir a lesão. Na verdade, o valor ou interesse jurídico tutelado como a transparência de procedimentos é um mero risco ou perigo de quebra do dever de imparcialidade, independentemente de ter produzido, em concreto, uma real e efectiva actuação imparcial, ou seja, independentemente de se ter produzido um efectivo dano. Tal como refere o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, in Processo n.º 00111/04,de 3NOV2005, ocorre violação do princípio constitucional da imparcialidade (art.º 266.º, n.º 2 da CRP), gerador de vício autónomo de violação de lei, sempre que sejam levados a cabo procedimentos que contenham o risco de consubstanciarem actuações parciais, independentemente da demonstração efectiva de ter ocorrido uma actuação destinada a favorecer algum interessado em concurso, com prejuízo de outros.
OBRIGATORIEDADE DE PUBLICITAÇÃO DE BENEFÍCIOS - Nos termos do nº 1 do artigo 1º da Lei nº 26/94 de 19 de Agosto que “Regulamenta a obrigatoriedade de publicitação dos benefícios concedidos pela Administração Pública e particulares”, é obrigatória a publicidade das transferências correntes e de capital que os executivos municipais efectuem a favor de pessoas singulares ou colectivas, exteriores ao sector público administrativo a título de subsídio, subvenção, bonificação, ajuda, incentivo ou donativo. Esta publicitação deverá nos termos do nº 2 do artigo 3º efectuar-se em jornal local e em boletim municipal ou, na falta deste, em editais afixados nos lugares de estilo, devendo as publicações ser efectuadas até ao fim do mês de Setembro, para os montantes transferidos no 1º semestre de, e até 31 de Março para os montantes transferidos no 2º semestre cada ano civil através de listagem organizada sectorialmente e contendo a indicação da entidade decisora, do beneficiário, do montante transferido ou do beneficio auferido e da data da decisão.
Será que foi cumprido o disposto nos arts. 1º, n.º 1, e 3.º, n.º 3, da Lei n.º 26/94, de 19/08, no que se refere à publicitação das transferências (subsídios), e ao procedimento,do cabimento prévio da despesa relativa aos apoios a conceder, facto passível de eventual apuramento de responsabilidade financeira sancionatória, nos termos da al. b) do nº 1 do art. 65º da Lei nº 98/97, de 26/08?
Será que os subsídios atribuídos não violaram o do disposto no art. 3º, nº 3 do DL nº 432/91, de 06/11, facto passível de eventual apuramento de responsabilidade financeira sancionatória e reintegratória, nos termos do disposto na al. b) do nº 1 do art. 65º e no nº 2 do art. 59º da Lei nº 98/97, de 26/08?
Artigo 335.º do Código Penal - Tráfico de influências “Quem obtiver, sem que lhe seja devida, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou a sua promessa, para, abusando da sua influência, conseguir de entidade pública decisão ilegal sobre encomendas, adjudicações, contratos, empregos, subsídios, subvenções ou outros benefícios é punido com pena de prisão de 6 meses a 5 anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal. Dispõe, por outro lado, o Art.º 382 (Abuso de poder) do Código Penal “O funcionário que, fora dos casos previstos nos artigos anteriores, abusar de poderes ou violar deveres inerentes às suas funções, com intenção de obter, para si ou para terceiro, benefício ilegítimo ou causar prejuízo a outra pessoa, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal”.
Ora, a intenção de causar prejuízo é discutível… a questão do “abuso de poderes” ou “violação de deveres inerentes às suas funções” e até o eventual tráfico de influências qual irá ser a decisão/avaliação do Ministério Público?
O Código Civil (artigo 6º) fixa um princípio geral de Direito: “a ignorância ou má interpretação da Lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas”.